Normalmente pensamos e vemos Lutero como o grande reformador
da igreja, a pessoa que mudou a maneira de ser igreja e de vivermos a fé.
Vemo-lo como aquele teólogo que redescobriu a graça de Deus e devolveu à
igreja. Quase não conseguimos ver Lutero como um reformador maior, que buscava
uma ampla reforma nas estruturas sociais e políticas de seu mundo.
A reforma não foi somente um anseio de Lutero para dentro da
igreja, mas uma necessidade que este via de serem feitas mudanças mais amplas
em toda a sociedade. Lutero ansiava por uma reforma na igreja e no mundo
secular. Muitos de seus documentos apontam para este caminho. Em 1520 escreveu
o Manifesto à Nobreza Cristã da Nação
Alemã, onde trata da separação dos dois reinos – Reino de Deus e Reino Secular
– e das responsabilidades dos governantes, também via uma reforma necessária no indivíduo
e em 1520 escreveu Da Liberdade Cristã. Em 1523 escreveu um direcionado principalmente
às Autoridades Seculares, tratando em até que ponto o povo lhes deve
obediência.
Na época da Reforma
os governantes não eram eleitos, estes tinham o direito hereditário, ou seja,
que nascia dentro de uma família nobre iria governar sobre área de domínio, seu
feudo. Ao povo aos não nobres, cabia obedecer. Os governantes carregavam para
si o direito divino e, baseados em Romanos 13, se permitiam de tudo, afinal, na
sua terra, eles eram o executivo, o legislativo e o judiciário.
Lutero, em 1526, escreve
ao príncipe da Saxônia e Turíngia sobre a atuação que seria possível , correta e
aconselhável de um nobre em seu feudo. O príncipe estava preocupado com sua
atuação e de que, havendo a separação dos dois reinos, como este poderia se
manter cristão atuando no âmbito secular.
Lutero explica que
os reinos não são excludentes, alguém está no reino secular, ou exerce função
neste, não está excluído do Reino de Deus. O universo pertence à Deus, e Deus
institui as autoridades seculares para executar a sua vontade neste âmbito de
Sua divindade.
A pessoa cristã está livre da lei, explica
Lutero, pois carrega dentro de si o amor de Deus e este prescinde da lei. A
pessoa cristã não precisa nem da lei nem de governantes que lhes guiem, já que,
guiados pelo amor de Deus, vivem o amor ao próximo, e isto até suas últimas
consequências. Porém muitas pessoas não seguem a fé e as pessoas
verdadeiramente cristãs são muito poucas. Além disto, toda pessoa cristã é ao
mesmo tempo justificada e pecadora.
Como muitos são
falsamente cristãos e os que não carregam o amor de Deus não vivem pelo amor e
graça de Deus se faz necessário uma autoridade que coloque ordem no mundo e faça
cumprir a vontade de Deus para todos. Assim Deus institui as autoridades à que
todos devem obediência, como Paulo nos escreve em romanos 13.1-7. Uma
autoridade do reino secular deve usar a lei para fazer cumprir a vontade de
Deus.
Lutero lembra os
príncipes de que estes também se encontram sob a lei secular e sob a lei de
Deus. Se nobre ou plebeu foi instituídos como governante é para cumprir a
vontade suprema de Deus de vida digna e plena para todas as pessoas, cristãs ou
não, conforme está no evangelho de João 10.10. As autoridades são instituídas
pelo próprio Deus, ao povo cabe obedece-las.
Quando uma
autoridade é colocada acima das leis e não obedece a vontade de Deus, então
esta deixa de o ser instituída por Deus. Como pode alguém executar a lei e a
vontade de Deus quando se coloca acima dela? Então o povo pode e deve confrontar
esta autoridade, desde que o faça a partir das leis e da vontade de Deus.
Ainda hoje estes
escritos são revolucionários, tanto para o povo do Reino de Deus, como para as
nossas autoridades instituídas, pelo voto ou por indicação. Às pessoas cristãs
cabe seguir a suprema vontade de Deus e o amor, aos outros cabe fazer cumprir a
lei.
LUTHER,
Martin. SECULAR AUTHORITY: TO WHAT
EXTENT IT SHOULD BE OBEYED. http://ollc.org/wp-content/uploads/2013/11/Secular-Authority-To-What-Extent-It-Should-Be-Obeyed.pdf