João 8.1-11
Um dia, um certo homem chamado Jesus, apelidado de o Cristo,
estava de boas, sentado sobre uma pedra no pátio do templo e, com um graveto,
rabiscava desenhos e palavras a esmo no chão, absorto em pensamentos que
ninguém nunca saberá.
Então, o imponderável aconteceu, uma turba raivosa, todos
homens, interrompeu sua paz. Vinham gritando, com punhos cerrados, pedras na
mão e, à sua frente, empurravam uma mulher apavorada, já espancada, amarrada.
Aos gritos tiraram nosso homem de seus pensamentos para que se unisse à turba.
Estavam no pátio do templo, era para julgar, mas já tinham condenado, de
antemão, a mulher. Ela era adúltera e tinha que ser apedrejada, empedrada,
morta!
Mas não era somente a mulher que queriam condenar, também queriam
condenar, ou até já tinham condenado, o homem. Traziam a mulher até ele, ou ele
se juntava à turba, ou se juntava à mulher. Ou assumia o discurso de ódio da
turba, ou era apedrejado com a mulher.
Nosso Filho do Homem tentou não se envolver, no entanto a
turba insistia, instava, instigava, incomodava. O homem queria ficar com seus
pensamentos, seja lá quais fossem, suas reflexões, seja lá quais fossem e seus desenhos,
que não deviam ser nenhuma obra de arte. Entre irritado, inconformado e resignado,
nosso homem – chamado Jesus, apelidado de Cristo, autocognominado de Filho do
Homem – levanta a cabeça e, num suspiro, joga para a turba uma só frase:
“Quem não tem pecado que atire a primeira
pedra!”
A turba ficou imóvel, em silêncio, sem saber o que fazer. Esperavam
um discurso, quer seja em defesa da mulher, ou em ataque à turba, mas não, o
homem apenas jogou uma frase, uma simples frase, quase nada, nove palavras,
nada mais. Eles estavam prontos para o ataque, para o apedrejamento, não da
mulher, mas do homem, que no chão desenhava.
Agora era o homem que incomodava, que desacomodava, que
pervertia, que subvertia, as idéias, as leis, as autoridades, os julgamentos,
as condenações, os discursos de ódio. O homem continuava sentado, com seus
pensamentos, com seus desenhos, tentando ficar de boas. A turba,
que queria incomodar, estava
incomodada,
que queria acusar, sentia-se
acusada,
que queria acuar, estava acuada,
que queria desacomodar, estava
desacomodada,
que queria confrontar fora
confrontada, sem confronto, sem debates, sem argumentos, e o homem, continuava
sentado, de boas, e a turba, confrontada sem confronto, foi se retirando, aos
poucos, até restar somente o homem, absorto em seus pensamentos, e a mulher,
que o observa, admirada, enquanto ele continua à rabiscar, com um graveto, na
areia.
Pode ter passado um longo tempo, ou o empo pode ter parado,
pois foi o que pareceu à mulher, até que o homem se deu conta que ela ainda
estava ali. Ainda de boas, ele olha ao redor, não vendo mais ninguém, além da
mulher, batida, espancada, cuspida, xingada, agora aliviada, encarando
admirada, o homem, absorto em pensamentos e fazendo desenhos na areia.
“Onde estão os que queriam te condenar, foram embora, pergunta o
homem à mulher. Ninguém te condenou?
Muito menos eu vou te condenar. Agora vai, volta pra tua vida.” E o Homem,
de nome Jesus, apelidado de Cristo, autocognominado Filho do Homem, voltou aos
seus pensamentos, aos seus desenhos.
Fatos acontecidos na igreja me
fazem pensar muito sobre esta história e sobre Jesus. Somos todos iguais à
turba, sempre prontos a condenar, muito antes de julgar, de pesar os fatos, de analisar
com calma a questão. Se levássemos à questão àquele homem, de boas, sentado na
pedra, desenhando no chão, absorto em pensamentos, o que ele diria? Que lado
apoiaria? Apoiaria algum lado? Não posso saber, e acho que ninguém poderia com
certeza. Só podemos olhar para o que ele fez:
- Não condenou a mulher,
- Foi jantar com Zaqueu,
- Tinha um estranho grupo de
seguidores,
- Derrubou do cavalo e escolheu
um de seus perseguidores,
- Curou no sábado,
- Curou endemoniados,
E olhar para o que ensinou:
-
Amar ao próximo como ele amou,
-
Não julgar para não ser julgado,
-
O sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado,
-
Entrem pela porta estreita...
-
Juntem riquezas no céu,
-
Vocês são sal e luz para o mundo....
Eu fico pensando, que frase ele nos diria?
“Quem não acusa do alto de sua ideologia e
posicionamento político (e teológico) que atire a primeira pedra"?
O que ele diria, para nós, turba?
No comments:
Post a Comment